terça-feira, 2 de abril de 2013

“Em busca de um centro para o Direito Administrativo”


Há ou deve haver um conceito central do Direito Administrativo?

Havendo esse conceito, qual deve ser?


A questão era essencial do início do Direito Administrativo (séc. XIX – no auge do positivismo jurídico). Cada disciplina científica procurava ter um centro, procurava ter uma realidade em volta da qual era construído um modelo científico e doutrinário. E no caso do direito administrativo as primeiras concepções jurídicas foram actocêntricas, fizeram do acto administrativo o centro do direito administrativo.

Havia nos finais do séc. XIX, princípios do séc. XX, esta ideia de que uma determinada ciência tinha um conceito chave e à volta desse conceito era construído todo um universo jurídico adequado a essa realidade - lógica fechada, positivista. A preocupação do positivista jurídico era a de construir uma ciência tão pura, tão pura que se perdeu a ligação à prática e que a prática se vingou do direito e, portanto, de alguma maneira a ironia no quadro da lógica de construir um modelo com um determinado centro e totalmente organizado, era a de essa questão assumir uma importância excessiva e corresponder a um esquema fechado e entendido num sentido que era normológico e que, portanto, perdia a ligação com a realidade. A lógica clássica era a de considerar o acto administrativo como o centro do direito administrativo. E este acto era um acto autoritário, o acto que correspondia à definição do direito aplicável ao súbdito no caso concreto.

O Professor Vasco Pereira da Silva diz-nos que a questão assim colocada não faz sentido e que se hoje em dia ainda é possível falar em conceito esse conceito só pode ser mais geral e abrangente – embora duvide que ainda se possa falar em tal questão.

Esta realidade correspondia a uma construção autoritária do direito administrativo que tinha por base a lógica de uma administração agressiva, que existia apenas para garantir a segurança dos particulares.

Isto era assim no séc. XIX e vai entrar em crise no séc. XX porque o surgimento do estado social traz consigo o modelo de administração prestadora e essa administração prestadora já não coloca o acto administrativo no centro da sua actividade. Essa administração prestadora usa múltiplas formas de actuação.

A administração escolhe qual é a forma de actuação mais adequada à obtenção do resultado que pretende. O acto administrativo deixou de ser a forma de actuação administrativa para passar apenas a ser uma das formas de actuação administrativa, uma entre muitas, e isto faz com que daqui resulte, desde logo, a primeira crise do acto administrativo.

Por outro lado, havendo todas estas formas de actuação era preciso procurar algo que fosse comum a elas e começou-se a ver que aquilo que existia antes do acto e aquilo que estava para além do acto, começou-se a olhar para o procedimento, o acto é o resultado de um procedimento em que participam entidades públicas e privadas.

E essa foi uma das vias alternativas do acto administrativo como construção central, a partir dos anos 50/ 60, a doutrina administrativa italiana introduz esta discussão e que depois prolonga nos anos 70/ 80, e ainda hoje encontram no quadro de orientação italiana esta ideia de que o procedimento é uma realidade anterior e posterior ao acto administrativo e, portanto, é uma realidade que por ser comum a todas as formas de actuação está em condições de poder funcionar como conceito central alternativo.

Por isso a doutrina germânica passou, também a partir dos anos 50/ 60, a dizer que a alternativa ao acto administrativo no quadro da administração prestadora era a relação jurídica.

 

Este acto que agora começa a ser entendido no direito administrativo é um acto que produz efeitos múltiplos, uma relação que se estabelecia entre a autoridade administrativa que tinha emitido o acto e o destinatário dessa actuação administrativa, e aquilo que corresponde à lógica dos anos 70 é o surgimento de novos titulares de direitos subjectivos, no quadro de relações jurídicas que são multilaterais.

A fazer ainda sentido já não pode ser o sentido do século XIX, a fazer sentido é apenas considerando que ela corresponde à procura do conceito mais alargado, do conceito que ainda está em condições de explicar um maior número de relações jurídicas e, portanto, nesse sentido poderia ser o da relação multilateral.

 

 

Sofia Teresa de Bragança

21786

2-4-2013

Sem comentários:

Enviar um comentário