segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Ministro vs. Secretário de Estado


O Estado-Administração é uma pessoa colectiva pública, já que a sua participação no exercício da função administrativa do Estado-colectividade é necessária, directa e imediata e por direito próprio, decorrendo da CRP.
Dos órgãos simples que integram o Governo, a CRP apenas autonomiza, para efeitos de competência, o Primeiro Ministros e os Ministros (204º)
O ministro é o órgão simples integrante do Governo que exerce, por direito próprio, funções politica e administrativas e tem assento no Conselho de Ministros, respondendo perante o Presidente do Conselho. Cada um deles dirige o seu ministério e assegura as relações entre o Governo e os demais órgãos do Estado-colectividade e entre o Governo e as entidades administrativas em geral, no âmbito do respectivo ministério.
Como regra geral pode dizer-se que todos os ministros se encontram juridicamente na mesma situação, submetidos a idêntico estatuto: é o princípio da igualdade dos Ministros.
No entanto, e como salienta o Professor Freitas do Amaral, na prática não é assim tão simples. As circunstâncias sociais implicam que uns ministérios tenham mais peso e importância. É o caso do Ministro das Finanças, do qual, de certa forma, dependem todos os outros ministérios e que é responsável pela preparação do Orçamento de Estado.
Na competência dos Ministros, inserem-se as seguintes funções: a) fazer regulamentos administrativos respeitantes ao seu ministério, b) nomear, exonerar e promover o pessoal que trabalha nos seu ministério, c) exercer poderes de superior hierárquico sobre todo o pessoal do seu ministério, d) exercer poderes de superintendência ou de tutela sobre as instituições dependentes do seu ministério ou por ele fiscalizadas, e) assinar os contratos celebrados com particulares e outras entidades, quando versem sobre matéria que diga respeito ao seu ministério, sempre em nome do Estado e, f) por último resolver todos os casos concretos que, por lei, devam ser tratados por qualquer serviço do seu ministério. Isto significa que o ministro terá de resolver todos os problemas, seguindo o princípio de que tudo sobe ao escalão superior para decisão. Isto não implica que os Secretários de Estado ou Subsecretários não possam ser responsáveis por estes assuntos se para isso tiverem competência desconcentrada ou tiver havido uma delegação de poderes por parte do ministro.
O secretário de Estado constitui outra categoria de órgão simples integrado no Governo, não exercendo, em regra, funções politica e legislativas, mas exercendo funções administrativas delegadas pelos Ministros. A partir de 1958, os secretários de Estado dispunham de competência legislativa própria, e chegaram a dispor de competência política e legislativa e a terem assento em Conselho de Ministros. Em 1980, devido à lei orgânica 3/80 de 7 de Fevereiro, perderam a competência administrativa originária e própria, primado sobre os subsecretários de Estados apenas em termos protocolares sobretudo pela substituição dos Ministros e colaboração directa com estes. Desde então dispõem de mera competência administrativa derivada delegada, sob orientação dos Ministros, que não são seus superiores hierárquicos, mas sobre eles exercem supremacia politica e administrativa. Assim, os Secretários de Estado não têm funções política e administrativa nem participam no Conselho de Ministros, com excepção dos casos de substituição do ministro ou em Conselhos especializados. No que se refere à sua posição dentro do Governo, agem por delegação, sob orientação directa dos Ministros, como refere o artigo 8º nº 2 e 4 do Decreto-Lei 86-A/2011 mas não estão subordinados hierarquicamente a estes, apenas existindo uma supremacia política. Obviamente que também respondem perante o Primeiro-Ministro, e a sua competência também pode ser delegada por este.
Conclui-se que não existe relação de subordinação entre os Ministros e os Secretários de Estado, típica da relação de hierarquia, em que ao superior hierárquico é permitido definir os termos do comportamento funcional do subalterno, mesmo sem fundamento legal, sem ser por via normativa. O que existe é uma relação de subordinação politica que implica que os Secretários de Estado se insiram na orientação definida pelo Ministro, mantendo a confiança deste. Esta relação política pode até implicar que o Secretário de Estado perca o seu cargo devido a falta de confiança.
Essa relação de confiança que vincula os dois membros do Governo, permite dar ao Secretário de Estado um maior campo de acção. Por exemplo, este não é obrigado a apreciar ou a decidir em matéria em que o Ministro eventualmente tenha interesse pessoal. O Secretário de Estado pode invocar a existência de circunstâncias ou razões ponderosas que o levem a suspeitar da sua imparcialidade, para se escusar a apreciar ou a decidir um processo que não tenha em vista a prossecução do interesse público. Este interesse pessoal pode ser inserido no conceito de “impedimento” do art. 185 da Constituição da República Portuguesa. Este conceito deve ser preenchido por todas as situações de facto que impliquem a impossibilidade de exercer os poderes incluídos na competência do titular do cargo.
Nestes casos, a situação será resolvida através da substituição do Ministro, de forma a assegurar o exercício de funções, em substituição do titular que as não pode exercer, por causa juridicamente relevante. O poder de designação do substituto cabe, por sua vez, ao Primeiro-Ministro. Este poder é totalmente compatível com a inexistência de relações de subordinação hierárquica entre este e os restantes membros do Governo. Tal como defende a doutrina italiana, a competência do Primeiro-Ministro não significa transformá-lo em superior hierárquico, sendo que este poder pode ser reconhecido a órgãos não estruturados em posições de hierarquia.

Em síntese, conclui-se que os membros do Governo não estão organizados hierarquicamente. O Ministro e o Secretário de Estado relacionam-se através de delegação de poderes. Esta figura baseia-se na faculdade atribuída por lei a um órgão, mediante a qual este tem a possibilidade entre duas formas legais de prosseguir parte da sua competência. Ou exerce em ele próprio ou permite a outro órgão o exercício em concorrência, através de um acto de delegação. A doutrina clássica concebia o poder de delegação como fenómeno exclusivo da hierarquia administrativa. Assim, o titular do órgão delegante seria sempre superior hierárquico do titular do órgão delgado. Critica: o poder de delegação pode existir mesmo entre órgãos não hierarquizados. A hierarquia não implica necessariamente a delegação do superior hierárquico. Prova disso é a proliferação de delegações intersubjectivas onde não pode existir hierarquia administrativa, afastando por completo a concepção clássica.
Pode-se falar em relações de independência funcional, no interior de um órgão complexo em que se geram situações de pluralismo orgânico, entre os ministros e entre estes e o Primeiro-Ministro e de relações de coadjuvação, no que se refere à relação entre Secretários de Estado e Ministros.

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